Finalmente, em outubro deste ano aconteceu: Salvador sobral, vencedor do Eurofestival em 2017, atuou nos Países Baixos. O público do seu concerto foi presenteado com uma agradável surpresa: Salvador cantou Ramses Shaffy… em neerlandês! A razão: uma cantora e compositora de dezanove anos de Nimega. Eurostory conversou com Irene Pluym, que pela segunda vez, cantou em dueto com o Salvador.

Irene! De repente estás no palco com o Salvador Sobral. Não cantaste apenas com ele, mas parece teres sido tu o cérebro por trás da sua excelente interpretação de Zing, vecht, huil, bid, lach, werk en bewonder. Mas… nós não te conhecemos.
Ah ah, é possível. Eu já trabalho há algum tempo como cantora, compositora e música, mas também ocupada com os estudos. No ano passado lancei o meu primeiro single e agora ando a pensar quais os próximos passos.

Quando descobriste o Salvador Sobral? Foi aquando do Festival da Eurovisão de 2017?
De facto, um pouco antes. Em 2015 fui convidada para abrir, no teatro local, os concertos dos diversos artistas. E assim fui associada às OG3NE, as quais segui nos anos seguintes, e, portanto, também quando elas representaram os Países Baixos no Eurofestival em 2017. A um dado momento decidir procurar os concorrentes das OG3NE e encontrei um vídeo com a recapitulação de todos os participantes desse ano. E então, entre todo o espetáculo e fogo de artifício, apareceu Portugal. Hey, o que foi aquilo? E fui ver o vídeo completo. Bem…

Bem…
Pode soar estranho, mas chorei em frente ao computador quando ouvi pela primeira vez Amar pelos dois. Não percebi palavra alguma do que ele cantava, o rapaz com as suas músicas simples e apenas um microfone, mas cativou-me. Desculpem OG3NE, pensei eu, mas este ano sou fã de Portugal. Eu nunca fui muito interessada no Eurofestival, mas a partir daquele momento sim. Vi todos os espetáculos, com banners do Salvador e tudo. E ainda por cima venceu! Que algo assim autêntico, algo sincero, conseguisse vencer! A mim deu-me muita energia como cantora e compositora. Um ano depois estávamos em Espanha (parte da minha família é espanhola, e vamos a Espanha todos os verões), e de surpresa a minha mãe tinha arranjado bilhetes para um concerto do Salvador! Foi muito especial, porque devido à frágil saúde do Salvador, todo o cuidado era pouco e ela apenas atuava em Portugal e Espanha.

Conheceste-o lá?
A sua banda sim. Cheguei muito cedo à praça onde iria atuar. Todos os membros da banda já lá estavam. Conversei com o Júlio, o piano que então estava na banda e o manager juntou-se à conversa. Perceberam que eu era dos Países Baixos e que lá estava de propósito para ver o Salvador. Ficaram impressionados. Disse que tinha aprendido de cor as canções: Amar pelos dois e Mano a Mano, incluindo a pronúncia em português. Canta um bocadinho, pediu o Júlio. Fi-lo e gostaram tanto que desde então mantemos contacto.

E em 2019, o Salvador pode finalmente atuar no resto do mundo.
Sim! No seu álbum Paris, Lisboa estava o tema Anda estragar-me os planos no qual um instrumento de cordas que soava a um cavaquinho. O músico que o tocava, não pode estar na tournée inteira. Nesse momento contactaram-me e perguntaram-me: ‘Irene, tu tocas cavaquinho? E cantas bem. Amanhã tocamos em Essen, que é perto dos Países Baixos certo? Podes vir lá e atuar connosco nesse tema?’

Amanhã? Perguntaram isso um dia antes?
Sim.

Não entraste em pânico?
Em parte! Mas isto é a beleza do Salvador: para ele é muito importante que te sintas à vontade. Por isso, durante o soundcheck (era a primeira vez desde Espanha que estava com os músicos) perguntou-me constantemente se eu estava bem, se eu queria mudar algo, o que era agradável e simpático. E bem necessitava, porque na altura eu tinha apenas dezasseis anos, nem percebia bem o que estava a acontecer. Mas tudo correu muito bem, foi mesmo uma festa aquela noite.

A ilustradora Saskia Halfmouw também esteve presente no concerto de Salvador Sobral a 2 de novembro de 2021 em Nimega, Holanda. Ela fez a ilustração abaixo.

Ok, isso foi Essen, 2019. Agora Nimega, 2021, onde não foste apenas uma convidada…
O Salvador tenta sempre aprender uma canção na língua do país onde atua. Quando se tornou claro que os concertos nos Países Baixos iriam avante, voltaram a contactar-me – porque sim, em Espanha eu era a ‘miúda’ dos Países Baixos, em Essen também, e agora que viriam aos Países Baixos em quem pensariam? Na miúda da Holanda. Perguntaram-me se conhecia uma canção apropriada. Dei algumas sugestões: a versão neerlandesa de Ne me quitte pas de Jacques Brel, Laat me de Ramses Shaffy e Zing, vecht, huil, bid, lach, werk en bewonder, também de Ramses Shaffy.

E ele escolheu a última.
Era a que tinha o texto mais difícil, mas também a mais alegre. Era o que ele queria, acabar o concerto com esse tema. Ainda disse: neerlandês é foneticamente complexo, já será muito bom cantares o refrão. As sete palavras não serão complicadas. Mas típico Salvador: ele tinha de e iria aprender as duas estrofes. Ao aprender, pareceu ser mais difícil do que ele tinha previsto. Usei um gravador de voz para lhe enviar a canção complete com articulação clara o que o ajudou.

E vocês atuaram novamente juntos, mas com outra canção. Uma canção mais difícil.
Sim. Só um Beijo escrita pela sua irmã, Luísa. Normalmente ela também a canta e tem uma voz grave e bonita. Eu ‘fui’ por momentos a Luísa, uma fasquia mais elevada para mim, mas creio que correu bem.

Isso é um eufemismo. Após a atuação o Salvador disse “Esta canção é tão difícil e ela interpretou-a com uma normalidade!”
Sim, ele disse mais tarde, que eu amadureci em relação a 2019. Que a minha voz estava mais adulta. Foi fantástico ouvir isso. Ele é uma pessoa tão querida e amável.

E inspirador?
Absolutamente! O Salvador não hesita e elevar a fasquia. Isso é também o jazz. Não tem que ser tudo perfeito, mas introduzir um pouco de improvisação e ver no que resulta. No final do concerto, alguns perguntaram porque não cantou Amar pelos dois. Respondeu que se a interpretar sempre, não consegue libertar-se dela. Compreendo o que quer dizer.

E agora? Vais continuar com música portuguesa?
Interessa-me muito, a língua, a cultura, a música, a poesia. No Instagram tenho contacto com várias pessoas do mundo musical português, mas não quero precipitar-me. Além disso, gosto de manter o contacto com o Salvador e as pessoas em seu redor. Não quero que os leitores pensem: ah a Irene fez assim e assado, vou tentar com as mesmas pessoas. Tenho uma forte ligação recíproca de confiança e quero que assim permaneça.

No ano passado foi lançado o teu primeiro single, Victorious. De que trata?
Escrevi o tema para um amigo que estava em baixo. É simplesmente uma mensagem para ele: és bonito como és, forte, mesmo na tua fragilidade. Escrevo assim a maioria dos meus temas, evito por enquanto a poesia, que para mim é um pouco vaga, tento pôr em palavras exatamente o que quero dizer.

Vais continuar com a música depois da escola secundária?
Ainda não sei. Nesta decisão o Salvador é exatamente uma fonte de inspiração. Provavelmente seguirei formação em música, mas e se escolher algo diferente? Adoro idiomas, talvez siga essa via. Ou talvez não siga mais formação e vou explorar o que o mundo tem para mim e que me possa inspirar. Talvez não tenha que ser assim tão planeado e a vida possa ser um pouco como o jazz.

Para terminar. O início desta colaboração foi o Eurofestival. Vês-te a atuar no palco da Eurovisão? 
Mal o Salvador ganhou, fantasiei sobre isso. Ouvi dizer que este ano iria haver inscrições abertas, ainda pensei um pouco sobre participar, mas não tinha nem composição adequada nem produtor. No passado sonhei com um Ziggo Dome esgotado, mas cada vez mais penso: precisamente as pequenas salas de espetáculos, com muito contacto com o público, são o mais importante para mim. Por outro lado, não consigo praticamente imaginar outro artista que esteja mais oposto do formato do Eurofestival, que o Salvador Sobral e até ele lá esteve. E venceu. Quem sabe…